sexta-feira, 30 de maio de 2008

O Cara

Essa noite eu sonhei com tio Duca. Foi um sonho bom, feliz, tranquilo. Não sonhava com ele há muito tempo. Em agosto, vai fazer nove anos que ele foi embora. Mas, às vezes, parece que foi ano passado que tudo aconteceu.
Tio Duca é uma das pessoas mais importantes da minha vida. Ele me ensinou a galopar e trotar na mão certa, me ensinou o galope esporte, me ensinou a contar os galões antes do salto, me ensinou a respeitar os animais, me ensinou que, depois da queda, temos obrigação de montar no cavalo de novo, mesmo que por dentro, a gente esteja morrendo de medo da outra queda (sim, porque a outra queda virá, inevitavelmente). Ele também me ensinou as primeiras lições de disciplina. Só ele mesmo para me tirar da cama às cinco da manhã, em pleno sábado, para às seis estarmos saindo do clube rumos as nossas trilhas pelas matas da Brennad, de Paulista, ou mesmo pela Caxangá. Só ele para entender que o hipismo era muito mais do que um esporte de elite, de gente bonita e elegante desfilando com seus puro-sangues. O meu tio Duca via a beleza do esporte além do que a maioria via, ele amava cavalos e amava, por extensão, todos que dividissem essa paixão com ele. Tive com ele momentos incríveis. Desde os puxões de orelha por causa da minha má-postura ou falta de empenho nas aulas, até aqueles momentos em que ele fazia questão de elogiar minhas virtudes como amazonas para as pessoas.

Foi tio Duca quem articulou, junto com meu pai, um dos melhores presentes que eu já ganhei. Faço questão de contar a todo mundo que me conhece que a minha festa de 15 anos ou uma viagem para a Disney, típica dessa fase, eu troquei por um cavalo. Isso mesmo: um cavalo Anglo-Árabe de cor castanha e de nome Hamadan. Meu primeiro e único cavalo. Imagine uma debutante cujos presentes são um rebengue, uma perneira, calças de monataria, uma bota novinha e... tcharam... uma cavalo! Valeu, tio Duca!

Dava orgulho cavalgar com tio Duca, sua postura impecável, sua técnica super apurada. A impressão que eu tinha era que ela já sabia de tudo. Puro engano, ele estava sempre querendo saber mais...

Essa era, aliás, outra característica forte dele. Tio Duca nunca se conformava, estava sempre em busca de se aprimorar. Era um senhor de seus 50 e poucos anos, atlético e bonito. E se estivesse com a gente hoje, seria um senhor de 60 e poucos anos igualmente encantador. Tio Duca era "O Cara".

Mas naquela tarde de 20 agosto de 1999, tio Duca morreu. Morreu fazendo o que mais gostava, montado num cavalo. Numa dessas ironias cruéis do destino, o cavalo no qual ele estava montado se assustou ou algo assim e ele caiu de cabeça no chão e não resistiu... Lembro daquela tarde, quando a notícia chegou na minha casa. Lembro da tristeza revoltada, da noite inteira chorando. Era a primeira vez que a perda de uma pessoa me tocava daquele jeito.

Hoje, a saudade é uma saudade boa, tranquila.... Vez ou outra, me pego pensando "se tio Duca estivesse aqui, chamaria ele para um passeio". Mas é por causa de sonhos como o que eu tive ontem que eu sei que, de fato, ele está aqui. No sonho, cavalgávamos juntos e ele estava feliz. Claro que eu levava um tombo, mas só para ele exigir que eu montasse de novo. Minha mãe, que sempre teve pavor de cavalos, estava e, incrivelmente, não se assustava com nada. Acho que era a presença de tio Duca que transmitia essa sgurança para ela.

De casa até o trabalho, vim lembrando dele. Seriam necessários muitos posts para traçar uma perspectiva geral do que essa pessoa tão querida representou em minha vida. Da próxima vez que ele "aparecer", vou contar mais...

Um comentário:

Nélio Carrara Fº disse...

Muito legal e emocionante sua história!
Você escreve muito bem, parabéns!

Tenho um blog sobre cavalos de hipismo, se quiser escrever algo sobre o assunto é só me enviar por e-mail: carrarafilho@hotmail.com
O blog é: www.hipismoclassico.blogspot.com

Um abraço,
Nélio